Nasci em Porto União (SC), em 1951, numa situação peculiar. Meus pais moravam em União da Vitória (PR), mas a parteira, Dª Catarina, tinha sua casa em Porto União. Cruza-se apenas a estrada de ferro e já se está em outro Estado. Foi assim que vim ao mundo pelas mãos da Dª Catarina, que morava em Santa Catarina. Meu pai, que era um homem corretíssimo, honesto e fiel aos seus princípios, registrou-me exatamente no local do meu nascimento: “nasceu em Porto União, será registrado em Porto União”. É assim que, já no nascimento, continuou comigo a história de integridade da vida de nossa família, neste simples ato do meu registro de nascimento. Mas sempre amei aquelas duas cidades, lindas e acolhedoras, como se fossem uma só.
Meus pais Stanislav e Amélia lá viveram grande parte das suas vidas. Ele, filho de imigrantes poloneses e ela, de avós italianos, das famílias Glomb e Massignan.
É com orgulho que falo de meus pais. Minha mãe sempre cuidou da casa e dedicou-se à educação dos filhos. Ela foi a grande condutora dos estudos, que acompanhava com vivo interesse. Meu pai foi um operário, um grande técnico de refrigeração, que montava enormes câmaras frias frigoríficas, caldeiras e máquinas pesadas. Era um homem fortíssimo, pois a sua musculação era no trabalho. Mas a grandiosidade do seu trabalho não se media nisto e sim na competência, na honestidade, na dedicação, na inteligência, aliadas ao carinho que sempre dedicou à família.
Somos o reflexo daqueles que nos formam, que moldam o nosso caráter. Foi assim com todos nós, seus filhos. As minhas irmãs, Nilce e Cleide, são o perfeito exemplo do que descrevo. Somos amigos e unidos.
A Suely, com quem casei, que conheci em Curitiba, por uma feliz coincidência, nasceu em Porto União, com a mesma parteira, foi batizada na mesma Igreja e comunga com os mesmos princípios.
Da minha terra natal ainda trago o privilégio de manter velhas amizades, algumas há mais de 60 anos, como a do Gelson Capriglione, mais que amigo, um irmão. Também outros amigos leais e inseparáveis: Eraldo Koppe, Airton Martins, Wilson Alves, Walmir Bernardino. Feliz aquele que pode contar com amigos verdadeiros.
Em breve período moramos em Curitiba, de 1960 a 1964, quando conheci a paixão pelo Atlético, meu clube de coração. Na Baixada, esperava a generosidade de algum adulto para ingressar sem pagar no acanhado Estádio Joaquim Américo.
Também nessa época tive meu primeiro trabalho, como vendedor de sorvete, e foi quando conheci a injustiça de pessoas que compravam e não pagavam. Nunca aceitei isso e desenvolvi um sentimento de intolerância a injustiças, Também cuidei de ovelhas, ganhando meio salário mínimo por mês, com 11 anos de idade. Ressalto que isto não me prejudicou em nada. Não atrapalhou minhas brincadeiras de infância e até me ajudou, tanto na responsabilidade, como na possibilidade de comprar livros que incentivaram meus hábitos de leitura .
O hábito da leitura começou muito cedo e já aos 10 anos, lia a página esportiva da “Tribuna do Paraná”. Iniciar a leitura dos jornais pela página esportiva tornou-se um hábito. Depois, tornei-me um grande frequentador das bibliotecas das escolas que frequentei e hoje, com bastante frequência, compro e leio bons livros, além dos livros de Direito, pois ao advogado é essencial manter os conhecimentos atualizados e aprimorados.
Continuei estudando normalmente, no Colégio Bagozzi e no Bom Jesus, as duas únicas escolas particulares que frequentei e pelo período de quatro anos. Ao retornar para União da Vitória em 1964, voltei a estudar em escola pública, no Colégio Estadual Tulio de França e na Escola de Comércio David Carneiro, ambas com ensino primoroso. Essa qualidade de ensino, com ótimos professores, me permitiu ser aprovado no primeiro vestibular que prestei para Direito, na Universidade Federal do Paraná. Minha mãe desejava que eu fosse médico, a tal ponto que, no dia em que vim a Curitiba para fazer a inscrição no vestibular, já no ônibus ela me chamou, abri a janela e ouvi um “pense bem se não é melhor se inscrever para medicina”. Segui minha vocação, da qual não me arrependo. Mais tarde, aprovado no primeiro vestibular, ela fez o máximo para que eu conseguisse realizar um bom curso e seguir uma carreira decente e dedicada. Ela e meu pai, minhas irmãs e a Suely, foram incentivadores formidáveis para o sucesso na carreira de advogado. Aliás, desde que conheci a Suely, todas as conquistas tiveram a sua participação fundamental.
Ingressar na faculdade foi uma grande vitória, mas nessa época minha família não tinha como manter-me em Curitiba, cursando uma faculdade cujas aulas eram pela manhã. Tive ajuda fundamental da minha irmã Nilce, que era professora, que pagou a minha parte na República, na Rua Treze de Maio, onde vivi meu primeiro ano, com mais 12 estudantes. Não consegui emprego de meio expediente, até que surgiu um concurso público na própria UFPR com horário das 12:00 às 18:30 horas, possibilitando compatibilizar estudo e trabalho. Quatro ou cinco vagas para mais de 600 inscritos, fui aprovado e passei a trabalhar na reitoria da UFPR, no Departamento de Pessoal. Isto influenciou decisivamente minha opção pelo Direito do Trabalho. No quarto ano, tirei uma licença do emprego e fui estagiar no escritório do professor João Régis Fassbender Teixeira, um grande nome do Direito do Trabalho, com quem aprendi muito.
Após vencer a licença, reassumi o cargo público. A essa altura eu já estava namorando a Suely, com quem me casei. Pouco tempo depois, após refletir bem, tomei a decisão de me desligar do serviço público e me integrei ao escritório do Professsor Régis, com a confiança para vencer na profissão. Foi uma decisão acertada e se hoje eu estou nessa vida de advogado, muito se deve ao João Régis Fassbender Teixeira. Mais tarde, com o Régis já padecendo de uma grave doença, fui visitá-lo, numa tarde fria, junto com a sua filha Regina e a Suely. Foi um encontro emocionante, onde nós dois nos abraçamos e choramos. Eu lhe disse – “Régis, só tenho palavras de agradecimento por tudo o que você fez por mim . Tudo que aprendi devo a você”. Ele, no alto de sua sabedoria , chamando-me como sempre de Zelu, disse: “Zelu, você aprendeu muito, mas não aprendeu tudo. Você ainda não aprendeu que justiça não se agradece”.
Na minha vida foi fundamental a imensa ajuda da Suely. Casamos em 1977 e dela sempre tive o apoio fundamental para ter uma linda família, com três filhos – Angela, Daniel e Márcia, todos advogados, que nos deram 5 lindos netos – e uma carreira profissional dedicada. Suely é uma excelente advogada, esposa e mãe.
Constituímos, mais tarde, nosso próprio escritório, que deslanchou, pois sempre tivemos a colaboração de ótimos advogados, nossos parceiros, muitos dos quais hoje são juízes, desembargadores e um deles já chegou à presidência de um Tribunal. Sempre dedicamos todo nosso esforço nas causas que nos foram confiadas, com resultados muito positivos.
Pelas mãos do Dr. Newton José de Sisti, então Presidente da OAB-PR, iniciei atividades na Ordem dos Advogados, com atuação em diversas comissões e no Conselho. Após mais de 25 anos de trabalho absolutamente voluntário, como é o trabalho prestado na Ordem, fui eleito presidente do Instituto dos Advogados do Paraná e , na sequência, Presidente da OAB-PR em 2010. Lá , com uma diretoria muito unida e competente ao nosso lado, tivemos uma intensa atuação em muitas causas, destacando a forte pressão contra a corrupção que foi apurada na Assembleia Legislativa do Paraná, no episódio dos empregados fantasmas, denunciados no jornal da “Gazeta do Povo”, que ficou conhecido como Diários Secretos. E demos sequência ao grande trabalho que foi desenvolvido pelos presidentes anteriores, sempre em favor dos advogados e da sociedade. Nenhum dos nossos presidentes da OAB-PR tiveram, ou têm, participação política partidária, o que nos permitiu um trabalho com rigorosa independência, marca da Instituição.
Pesquisas realizadas à época do mandato, afirmaram uma aprovação de mais de 90% dos advogados, à gestão, o que deixou os diretores felizes e com o sentimento do dever cumprido com rigor. Na eleição seguinte, sequer houve chapa de oposição.
Nunca aspirei ser presidente da Ordem dos Advogados e do Instituto dos Advogados. Foi uma grande honra o reconhecimento dos colegas para poder representá-los, servi-los. No Instituto, criamos o Prêmio Francisco da Cunha Pereira Filho, em homenagem àquele ex-presidente, sobre a Liberdade de Expressão, essencial à própria sobrevivência da democracia.
Na Presidência da Ordem, sucedi Alberto de Paula Machado, um advogado em Londrina, extraordinário colega, um grande presidente da nossa instituição, sem desmerecer os demais. Nós aqui, no Paraná, tivemos a felicidade de termos grandes presidentes, não vou citar todos evidentemente. E não praticamos a reeleição, por melhor que tenha sido a gestão. Foi um orgulho participar de um trabalho voluntário tão intenso, sem qualquer remuneração, ou outro interesse senão o de bem atender aos advogados e defender o estado de direito e a sociedade brasileira.
E não me arrependo disso. Só trago recordações maravilhosas, como a grande manifestação que fizemos contra a corrupção, em 8 de junho de 2010, na Boca Maldita, reunindo mais de 20 mil pessoas, numa fria noite de inverno curitibano. O Brasil tem que ter pessoas que não dependam da política pra tomar decisões e que possam combater a corrupção de uma maneira firme. Ela, a corrupção, é como uma borracha: você aperta, ela cede, mas se soltar, ele tende a voltar ao estado anterior, que no caso é da continuidade desses desmandos.
Minha vida na Ordem foi um capítulo pessoal marcante e creio que bem cumpri meu papel. Isto só foi possível com o apoio maciço dos advogados, dos diretores, dos conselheiros, integrantes do Tribunal de Ética e Comissões. E, no meu caso pessoal, dos meus filhos que assumiram com competência o escritório de advocacia e deram conta do recado com sobras, sobrepujando este veterano advogado, com a importante colaboração de todos os colegas de escritório.
Minha vida é uma vida bem vivida, de quem ao longo da vida sempre praticou esportes, estudou e estuda, vibra com as vitórias e procura difundir a solidariedade.
Tenho apenas palavras de agradecimento. À família, aos amigos, aos colegas, aos clientes, aos juízes e servidores, aos funcionários do escritório. Muito teria mais a contar e descrever, em detalhes. Em 2015, percorri a pé, em trinta e três dias, os oitocentos quilômetros do Caminho de Santiago de Compostela. Aos que indagavam as minhas razões, sempre fui muito claro: estou aqui numa jornada de agradecimento a Deus e a todos que tive a fortuna de conhecer e que, de uma forma ou outra, participaram da minha vida. Uma jornada de fé. Não fui pedir nada, apenas fui agradecer.
Finalizo com a mensagem de agradecimento a todos, sejam velhos ou novos amigos, pela importância em minha vida. É impraticável registrar aqui o nome de cada um, mas todos estão marcados indelevelmente na minha memória. E se esse brevíssimo registro comportasse apenas duas palavras, não hesitaria em dizer MUITO OBRIGADO.