Sou curitibano, filho de Leyla Pernetta e Gaspar Velloso, nascido numa fria manhã de inverno no dia 9 de agosto de 1930 de parto doméstico, como era habitual naquele tempo, na casa de número 413, da rua Emiliano Pernetta residência de meus avós maternos Amália e Evaristo onde vivi por longo tempo e foi o cenário de uma infância agradável.
Meu universo na pequena e provinciana Curitiba de então, se restringia aos jardins floridos e ao grande quintal repleto de arvores frutíferas de minha casa e as aulas do curso primário no Grupo Anexo à Escola Normal posteriormente, Instituto de Educação. Situado a apenas algumas quadras abaixo de casa, percorria desde pequeno a pé e sozinho esse trajeto, tais eram as condições de segurança e circulação naqueles tempos.
Findo esse período onde o aprendizado corria tranquilo sob o comando de amáveis professoras, chegou o momento de passar a um novo patamar do ensino. Meu avô, a quem cabia definir meus caminhos, fez questão, como liberal e republicano, que eu seguisse frequentando ensino público. Assim com 11 anos, no ano de 1941, fiz o exame de admissão no Ginásio Paranaense, hoje Colégio Estadual do Paraná que funcionava no prédio da rua Ébano Pereira onde mais tarde, já abrigando a Secretaria de Cultura trabalhei em mais de uma oportunidade.
Tinha razão meu avô Evaristo a definir meu roteiro escolar e acredito que os anos de convívio com garotos oriundos das mais diversas camadas sociais e étnicas forjaram meu caráter e minha personalidade. Diferente do tratamento quase maternal que eu conhecia do grupo escolar, o secundário era um salve-se quem puder no qual me adaptei com facilidade.
Já nesse período comecei a revelar minha aptidão para o desenho. Meus cadernos escolares entre as anotações das matérias estavam sempre infinidades de desenhos de figuras que eu via nas tiras de quadrinhos. Nas aulas de desenho com o professor Pedro Macedo, discípulo de Andersen, pela primeira vez recebi um incentivo: uma tapinha nas costas e a costumeira frase “você tem talento, menino”. Com meus avós, que cultivavam a boa leitura como hábito e assistiam a todo o gênero de espetáculos de teatro e música que apareciam para temporadas em Curitiba fui desde cedo iniciado no mundo da cultura.
Com meu pai Gaspar, transitei entre os pintores e escultores com os quais mantinha relações de amizade até porque naquele período era jornalista muito relacionado. Por esse intermédio, no início do ano de 1948, fui logo informado da próxima abertura da Escola de Música e Belas Artes e fui dos primeiros a fazer a inscrição no Curso de Pintura. Achei que era o momento de testar a seriedade de minhas intenções com relação à Arte. A primeira turma do curso de pintura tinha cerca de vinte alunos, maior parte garotas e os professores que se sucediam, durante os anos seguintes nas diferentes matérias, eram quase na sua totalidade de tendência conservadora e acadêmica. Nesse universo, que não me entusiasmava, havia uma voz dissonante, do italiano Guido Viaro que logo eu e alguns dos colegas mais arrojados elegemos como nosso guru e que foi responsável por ter optado pela expressão artística moderna.
No final de 1952 terminei o curso tendo sido orador dessa que foi a primeira turma a concluir o curso de pintura. Aconselhado pelos mais experientes a buscar, além da arte, uma outra possibilidade profissional mais promissora para suprir as minhas necessidades futuras tomei, sem hesitação, o rumo do Direito, inspirado pelo fato de meu pai ser um ativo advogado cujo escritório muitas vezes perdia seu ritmo em função de sua dedicação cada vez mais intensa pela política. Assim prestei vestibular para a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, iniciando o curso jurídico no início do ano de 1951. Nesta altura aconteceu uma inevitável mudança tanto no ambiente de estudo quanto ao perfil de meus novos companheiros de curso.
Teve início aí uma dualidade de vida que persistiu por muito tempo. Não tive nenhuma dificuldade no transcurso de minha trajetória acadêmica e nesta fase ainda cumpri com minhas obrigações com o serviço militar cursando o Centro de Preparação de Oficiais da Reserva – CPOR – tendo sido declarado Aspirante a Oficial, da Arma de Intendência, em agosto de 1951.
Também nesse período iniciei minha participação no serviço público. Graças ao convívio com um grupo de colegas ligados à literatura e à poesia, complementado pelas conversas enriquecedoras que ocorriam após as aulas com alguns professores com os quais nos identificávamos, acabávamos sempre entre as estantes da Livraria Ghignone. Foi assim que me tornei um devorador de livros.
No final do ano de 1955, colei grau em Direito e logo a seguir fui inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil – PR. No ano seguinte, fui nomeado para cargo de advogado do quadro geral do Estado tendo então, ocupado funções de confiança no Palácio Iguaçú como Oficial de Gabinete, Chefe da Assistência Técnica e Chefe de Gabinete todas da Secretaria de Governo.
Com relação à minha atividade como artista continuava bastante ativo, tanto pela participação com minhas obras bem como fazendo parte de Comissões Organizadora de Salões de Arte e de mostras coletivas. Em função de minha militância a favor da aceitação da expressão artística moderna participei ativamente no episódio de protesto contra a discriminação explícita da arte moderna por parte dos órgãos públicos de cultura do Estado, configurado no que foi chamado de Movimento de Renovação acontecido quando se inaugurava o 14° Salão Paranaense em dezembro de 1957 e que veio a se constituir em um marco na vida cultural local. Neste mesmo ano, a convite do radialista Aluizio Finzetto, tive a oportunidade de produzir um programa semanal noticioso e crítico sobre arte na Rádio Guairacá intitulado “No Mundo das Artes” e mantive posteriormente uma coluna semanal com o mesmo objetivo no jornal Diário do Paraná intitulada “Artes e Artistas”.
Em 1958, realizei minha primeira exposição individual de pintura na Galeria Cocaco, instalada numa velha casa da primeira quadra da rua Ébano Pereira, que sob a direção do Ennio Marques Ferreira e do Manoel Furtado, tinha se consolidado como ponto de referência da arte moderna na cidade.
No ano seguinte, identificando um momento propício, deixei Curitiba para realizar um estágio em Paris na condição de estudante patrocinado pelo governo francês conseguido graças ao empenho da Sra. Helena Garfunkel, diretora da Aliança Francesa e contando com o apoio do Governo do Estado. Frequentei a Academia do mestre francês André Lhote renomado artista e teórico cubista, em seu atelier no n° 18, da rue D’Odessa, em Montparnasse tendo em meados de 1961, após realizar exposição individual na Galeria do Office du Bresil na rue de Boetie, uma obra incorporada ao acervo do Musée d’Art Moderne de la Ville de Paris.
Após ter retornado à minha cidade natal e voltado às minhas atividades profissionais tanto como artista plástico quanto como, nesta altura, advogado do serviço público estadual, passei a partir desta época, a prestar serviços por longo tempo em inúmeros setores da área cultural. Fui Chefe da Divisão de Planejamento e Promoções Culturais do Departamento de Cultura, Membro do Conselho Deliberativo da recém-criada Fundação Teatro Guaíra por dois mandatos sucessivos, primeiro Diretor do Museu de Arte Contemporânea do Paraná, do qual fui o idealizador, Membro da Comissão que procedeu ante projeto de regulamentação e implantação do Conselho Estadual de Cultura do qual fui nomeado membro, Chefe da Coordenadoria do Patrimônio Cultural da Secretaria de Cultura da qual fui anteriormente Membro da Comissão que instituiu e regulamentou sua criação, Diretor Geral da Secretaria de Cultura e Diretor Geral da Secretaria de Justiça, Membro do Conselho da Fundação Cultural de Curitiba além de muitas outras participações.
No decorrer dos longos anos na vida cultural brasileira, mostrei minhas pinturas em mais de 300 exposições coletivas e realizei inúmeras exposições individuais com destaque, as de Paris e de Berlin. Minhas obras fazem parte do acervo de inúmeros museus e instituições públicas. Entre as diversas publicações referentes a arte brasileira destaco os verbetes do Dicionário Crítico da Pintura no Brasil de J. R. Teixeira Leite e o Dicionário de Pintores Brasileiros de Walmir Ayala. Com um texto crítico do Prof. Fernando Bini e graças aos recursos da lei de Incentivo à Cultura da Fundação Cultural de Curitiba foi publicado em 2003, o álbum Fernando Velloso – O seguro exercício da forma e da cor.
Fui membro da Associação dos Museus de Arte do Brasil tendo ocupado os cargos de Secretário, Vice-presidente e por duas vezes Presidente. Sou membro da Associação Brasileira de Críticos de Arte e da Associação Internacional de Críticos de Arte. Tenho o registro profissional de Museólogo, tendo sido Presidente do Conselho Regional de Museologia da 5ª Região-PR.
Tenho quatro filhos: Cristina, Angela, Mauricio e Fábio que com meus três netos: Theo, Flávia e Pedro compõem meus descendentes. Desde 1977, estou casado com Maria Alice Xavier da Silva. Este é um apanhado do que me foi possível reunir para responder à pergunta “Quem é Você?”, em mais um esforço para resguardar a memória da gente do Paraná.
Em 1977, casei-me com Maria Alice Xavier da Silva, com quem sou muito feliz há quarenta e dois anos.
Este é um apanhado do que me foi possível reunir para responder a questão “Quem é você” em mais um esforço para resguardar a memória da gente do Paraná.